domingo, 6 de novembro de 2011

Floresta da Alma (Parte 1)


         A jovem andava pela praça principal de um pequeno vilarejo sob um capuz. Costurava as pessoas, imperceptível. Aproximou-se de uma banca de frutas e ofereceu algumas míseras moedas, indicando as maçãs rubras. “Só pode levar uma. E dê-se por satisfeita!” – disse o vendedor, ríspido. Ela pegou a maçã que este lhe oferecia, agradeceu e se foi. Comeu-a, satisfeita, como se fora um néctar dos deuses. Aquela certamente seria a sua única refeição do dia e poderia ser a única de muitos dias seguidos.
         Ela morava num mísero casebre na floresta e sobrevivia das peças que fazia em argila. Cada peça demorava dias para ficar pronta e nem sempre eram vendidas de imediato. Por isso, as moedas demoravam a aparecer. Além do fato de que nem sempre ela conseguia trabalhar de estômago vazio.
         Naquela noite, plena, a jovem ficou até tarde trabalhando. Foi dormir apenas quando não conseguia mais manter os olhos abertos. Exausta, esqueceu de apagar a vela. Acordou sufocada com a fumaça que tomava todo o casebre. Saiu correndo e assistiu impotente a vida, que até então conhecia, transformar-se em pó.
         Ela não tinha para onde ir. Não tinha parentes. Nem amigos. Estava só na floresta.
         Amanheceu.
         A jovem adentrou a mata sem consciência de seu destino. Talvez se perder de si mesma. Ou não. Caminhou até cair de sede. Avistou de longe uma matilha refrescando-se num rio, ao qual se dirigiu afoita. Bebeu daquela água, sem cogitar a possibilidade de um ataque dos lobos. Depois afastou-se.
         Sentia-se perdida. Havia deixado de ser o que era. E ainda não sabia em quê se transformara ou transformaria.
         Ao longo do dia, ela foi recolhendo galhos do chão. Precisaria deles para fazer uma fogueira à noite. Em sua busca, também teve a sorte de encontrar algumas frutas pelo caminho.
         O crepúsculo veio e, logo em seguida, a noite. A jovem fez a fogueira, mas não conseguiu dormir. Tinha muito medo que o fogo apagasse durante a madrugada ou que algum animal aparecesse.
         Pela manhã, a jovem comeu uma fruta e mais uma vez saiu em busca de gravetos. À noite, ficou em claro pastorando o fogo para que não se extinguisse antes da aurora.
         Alguns dias se passaram e a jovem ainda não dormiu. Permanece alerta para defender e alimentar aquilo em que ela está se transformando.

Seis de Novembro de 2011

Um comentário:

Poeta da Colina disse...

Ficamos a imaginar que rosto podemos encontrar do outro lado.