sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

O Ano se Vai feliz

Despeço-me de 2011 feliz, pois sei que aproveitei bem o ano. Tive alguns escorregões, algumas recaídas, sucumbi à autossabotagem várias vezes, mas tenho certeza que 2011 foi realmente um ano novo pra mim. Li livros que me fizeram mudar a maneira como me enxergava, conheci pessoas que me incitaram a mudança no pensar, descobri a poesia da mente, do corpo e do coração, e isso se refletiu em meus trabalhos. Foi um ano de metamorfoses ambulantes. E como foi! Adentrei florestas e saí de tocas; chorei rios e vi dias ensolarados de autoconhecimento.
Por isso, para 2012, não peço nada extravagante. Peço um olhar diferente, uma visão mais cheia de amor e gratidão. Quero simplesmente criticar e julgar menos. Libertar a luz que existe dentro de mim para ver a luz que habita o outro.
Então, que em 2012, sejamos mais luz, a luz do amor e da gratidão!
Plenitude para toda a humanidade em nós!

domingo, 25 de dezembro de 2011

Diálogos Internéticos na Literatura


         A Internet veio. Trouxe a praticidade e encurtou distâncias. Uma maravilha da revolução tecnológica! Mas nem tudo é perfeito.
         Se por um lado o computador e os programas de edição de texto pouparam-nos tempo e alguns dedos doloridos (outrora escravos da velha máquina de escrever mecânica), a Internet tirou toda a poesia dos diálogos com os programas de mensagens instantâneas. Para o dia a dia, confesso ser prático (praticidade é a palavra de ordem), mas para a literatura, perde a cor.
         Como escritora, sou adepta daqueles encontros furtivos, de diálogos sobre a relva ou de frente para o mar. Sim, sou romântica, gosto de romances históricos. Tento preservar sua poesia nos romances contemporâneos.
         Sejamos bem sinceros conosco mesmo, diálogos internéticos transcritos num romance parecem um peixe fora d’água. Além de quebrar o clima do gênero. Transcrevendo-os em forma de narrativa, perde-se o dinamismo de uma conversa. Colá-los exatamente como aparecem na tela do micro é como pôr um adesivo no meio de um desenho feito à mão. Pelo menos é essa a impressão que tenho.
         E cá estou eu escrevendo um romance e me deparo com este tipo de diálogo, sem saber como encaixá-lo de forma poética em minha prosa.
         Fico a pensar: o que será dos novos escritores neste mundo onde os diálogos próximos estão cada vez mais distantes e menos poéticos? A saída será o saudosismo?
         Enquanto a resposta não vem, vou ficar aqui queimando minha criatividade para ver se recebo alguma solução via sinal de fumaça.

Vinte e cinco de dezembro de 2011

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Sinto Muito, Noel


Começo este texto sem palavras na boca. Ou talvez seja o excesso delas que me furta a inspiração.
Este foi um ano sem precedentes (pelo menos que me salte à memória). Eu não vejo, sinceramente, o que pedir a Papai Noel. Talvez um pen drive de 8GB (risos!). Mas se o objeto não vier, tenho algo mais consistente: o amor. Este sentimento veio em plenitude este ano, soprado por corações de amigos, tanto novos quanto imemoriais, e por um coração especial que muito me ajuda a crescer. Assim sendo, sinto muito, Noel, mas não tenho o que lhe pedir neste Natal. Traga a guitarra que minha sobrinha quer. Talvez seja melhor não. A menos que traga um headfone pra mim (risos!).
Quero agradecer a todos que fizeram parte da minha vida em 2011 e compartilharam momentos importantes da minha vida comigo. E das suas vidas também. E agradeço ao Universo por tudo que ri, chorei, descobri, redescobri, aprendi e amadureci neste ano. Posso dizer que foi um ano de reencontros comigo mesma. E a única coisa que posso pedir para o ano de 2012 é que eu me encontre ainda mais e que estes amigos e os que ainda se escondem no porvir possam compartilhar mais um ano pleno comigo!
Obrigada a todos!
Feliz Natal e um Ano Novo de Plenitude!
Abraço!

Pétala de Saudade



sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Poética Bruteza

O diamante bruto.
Você não imaginava que ele
Fosse tão bruto assim. Nem que tivesse
Tantas arestas afiadas. Mas ele tem também
Muitas frestas por onde sai seu brilho singular,
Seu amor. Este brilho compensaria os cortes?
Não cabe ao diamante dizer. Só quem sangra
Pode saber. Este brilho proporciona-lhe cura?
Em caso afirmativo, então o sangue coagulará
E refletirá em brilho nos olhos. O diamante
Bruto corta tentando polir-se. E
Porque te ama. É exatamente
Por isso que ele quer
Se tornar
Polido.

Nove de Novembro de 2011

sábado, 3 de dezembro de 2011

Monólogo de Uma Saudade


         Não sei que sentimento me toma hoje. Ou talvez saiba. Talvez seja uma saudade doída. Daquelas bem bravas que parece dilacerar o coração do homem. Pobre coração imaturo! Ensaia um sofrimento tão desproposital quando não estás aqui. Quando nem em pensamento estás sólido, presente. Minha mente tenta, mas a saudade torna-te tão pueril. Necessito-o em suor e emudecimento. Os pensamentos me escapam das mãos. Devaneios, como água, escorrem por entre meus dedos tortos. Se tudo isso é saudade, nunca senti uma saudade tão gostosa como o fel. Um clarão na noite de um terrível paradoxo. Que queres com esta tua ausência? Extrair uma chuva torrencial na secura de minhas palavras? Pois confesso-te que consegues. Nada consigo fazer além de escrever palavras secas e úmidas. Verbetes ousados que desmentem a felicidade fingida. Os mesmos verbetes os quais manipulo numa tentativa fracassada de persuadi-lo de que estou bem. Mas tende certeza: se estas palavras cristalizam minhas lágrimas em tua presença distante, com quanto mais loucura meu coração saltará aos lábios quando tua ausência tornar-se próxima.

Trinta de Novembro de 2011

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Devaneios de Tempos Não Vindos


         Sou tua. Por inteiro. Sem meios. Meus pensamentos são teus. E eles te trazem para o presente, mesmo quando tentam criar o futuro ou relembram o amor que fizemos na sexta passada. Meus sentimentos e textos também são teus. Na verdade, deixaram de ser meus quando reclamaram por ti.
         Teus beijos são uma covardia. Beija. Beija minha ânsia por teus beijos. Vem, (des)beija essa vontade louca de te beijar. Esquece o horário que marcamos ontem. Esses tempos não vindos já cancelaram a viagem. Pega um pano, enxuga a chuva que não caiu e agora corre em rio. Toca o que era para ter sido tocado ontem. Não. Desculpe-me a pressa. Toque o hoje, a pele que vibra e se ouriça com o agora.
         O presente chegou pela brecha da porta. Pegou os amantes em flagrante delito. Estávamos nus. Nus de desculpas e justificativas. Mostre os pulsos, permita-se prender. Envolva-se pelo calor que nos cerca. Limite-se, sem pressa, ao espaço de nosso enrosco. Deixe-me tatear tuas diferentes texturas. Os dedos também respiram. E te absorvem.
         Comparsa, parceiro, mente brilhante. Seja diferentes amores para mim. Forjemos este crime de tal maneira que cada qual permaneça com sua culpa. Só a sua. Sem excessos nem sobras. Cada um tem a culpa que merece e procura.
         Sejamos, então, punidos igualmente por amarmo-nos tanto. Pena máxima: mais amor.

Vinte e Nove de Novembro de 2011

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Sexo Linguístico

Abraça-se às minhas palavras.
Enrosca-se com as rimas desta poesia.
Beija os meus versos contidos.
Lambe os verbos no infinitivo.
Suga as entrelinhas.
Morde o contexto.
Amassa os devaneios do eu lírico.
Aperta os sentimentos em desalinho.
Cheira o sussurro das conjunções.
Grita o gozo do predicativo.
Agora deixe-me brincar com o aposto.
Aconchegar-me em teu soneto.
Tagarelar teus adjetivos em afonia.
Se ainda assim sobrar algum silêncio,
Deixa-o acomodar-se em nosso enlace
E roubar-nos tudo que seja inexprimível
Pela insuficiência de palavras que lhes traduza
Com exatidão e competência.

Vinte e Dois de Novembro de 2011

sábado, 19 de novembro de 2011

Partícula


         Eu sou cromossômico. Sou mínimo na vastidão. Um zigoto que deu certo. Uma semente de carvalho que anseia por raízes. O pássaro depenado dentro do ninho que sonha com o voo. Sou uma partícula do mundo. Pareço ínfimo. Entretanto, o mundo não existiria dessa maneira sem mim. Seria totalmente diferente. Se tirássemos um pouco de azul, a Terra não seria tão “planeta água”.
         O mundo é um sem-número de partículas como eu. Mas a maioria se isola do grande todo. Existe, usufrui, mas não se sente integrado. Às vezes nós nos sentimos assim quando o mundo não quer seguir nossas vontades. Eu mesmo me peguei pensando assim hoje. Mas se eu tenho o direito de chorar, de ser antipático, de sorrir e de festejar, por que o Universo também não tem? Não é o mundo que tem que se adaptar às nossas oscilações de humor. Nós é que precisamos aceitar os seus períodos de vida e morte. A morte não é só extinção, é qualquer baixa de humor, chuva, trovões. Sabe quando o dia está nublado, cinza? É a natureza dizendo que está triste, sem querer muito contato.
         A parte renova-se no todo. Como uma folha, que só permanece viva enquanto na árvore. No chão, murcha e seca, até ser absorvida pela Terra. A vida jamais é desperdiçada. Ela simplesmente é direcionada para outro lugar.
         Quando me sinto cansado e desanimado, tenho certeza que me desliguei da fonte. Quis criar uma vida paralela à Vida. Então é hora de voltar para o todo para beber desta. Afinal, eu só posso me sentir vivo se estiver em contato constante com a Vida. Sem ela somos folhas secas: estamos ali ocupando espaço enquanto nosso último resquício de vitalidade não é absorvido para gerar novos brotinhos.
         Se sou parte, então não posso me desligar do todo. A Vida é uma só. Não existem vidas paralelas que possam ser plenas e felizes.

Dezoito de Novembro de 2011

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Dispersão e Saudade


         O pensamento vem. Um não, vários. Inevitável. Quem sabe pudesse conter. Não deu. Ele já chegou. E acomodou as pernas no banquinho defronte ao sofá. Sinto um frio na barriga. Gostoso. Algo cristaliza. Converto-me em sorriso. Um olhar transbordante.
         Nada em especial aconteceu hoje. Depois de algumas horas, qualquer tempo é eternidade para a saudade. Uma vírgula é um texto inteiro. O sorriso vem mesmo assim. Memórias antigas, tão recentes, te trazem para o meu lado. E me distanciam de ti.
         A lua permanece encoberta. Nuvens atrevidas! Anseio o azul limpo. Desnudo. Algumas estrelinhas romperam a escuridão. Abriram um buraco no manto celeste. Eu posso ouvir burburinhos de mais estrelas vindos de dentro do breu. Astros maiores que não conseguem passar pela pequena fissura.
         É dia. A noite ainda não chegou. Espero que as nuvens se dissipem. Está abafado aqui dentro. As janelas estão abertas. O vento que rareou. Não quis mais assanhar meus cabelos. Vai cair uma chuva torrencial. De coisas boas, espero eu.
         O amor existe. Eu sei. Ou talvez suponha. Mas queria ouvir o mar.

Dezoito de Novembro de 2011

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Luzinhas


Os cristais ainda parecem estar dentro dos meus olhos.
Pedras preciosas que brilham quando o sol bate na água.
O sol surge por trás das nuvens.
Mas em algumas partes ainda é noite.
Algumas criaturas ainda estão dormindo.
E sua força permanece em estado latente.
Outros seres, aparentemente mais frágeis,
Tentam espalhar pequenas luzinhas pelo caminho
Na tentativa de chamar o sol.
Sol que seria capaz de despertar
As criaturas mais fortes.
Criaturas estas que protegem a floresta.
O céu ainda está azul cobalto e a lua visível.
Vamos... continuar pendurando as luzinhas por entre os galhos.
Até amanhecer na floresta inteira.

Quatorze de Novembro de 2011

sábado, 12 de novembro de 2011

Embriaguez Lúcida


         Ela tinha os globos oculares voltados para mim. Porém, seu olhar estava distante. Fitava algo dentro do nada. Mas o que lhe vinha à mente parecia estar muito perto. Tanto que tive a nítida sensação de ver seu corpo estremecer. Como se ela estivesse sendo tocada pelas memórias recentes.
         Curiosa, perguntei o motivo. Ela falou, sorrindo. A ficha parecia não ter caído ainda. Só a mudança física lhe dava certeza do ocorrido. Contudo, a certeza parecia não ter chegado ao cérebro. Ou até tivesse chegado. Mas ela não estava lá para recebê-la.
         Conhecia-a desde outrora. Muito antes dela. Pensávamos que ficaria inebriada quando tal coisa acontecesse. Culpa das ideias oniricamente distorcidas que ela alimentava sobre essas coisas. Pensava eu que ela ficaria num estado semelhante ao da embriaguez. Dispersa, entretanto, era impossível que não ficasse. Afinal, esse era seu estado natural.
         “Se tudo tivesse acontecido um ano antes, talvez tivesse me perdido do centro” – confessou-me. Lembrava-me bem que sempre via essas coisas como se fosse uma orquídea no cume da montanha mais alta, e agora a mesma orquídea estava no pé da mesma. O (quase) inalcançável tornou-se mais próximo e natural. Eu me sentia satisfeita e orgulhosa por seus pensamentos terem amadurecido dessa forma.
         Um sorriso brotou-lhe nos lábios e também nos olhos. Estava feliz. Muito feliz por ter acontecido. “Não foi cheio disso ou daquilo, todas aquelas frescuras...” – comentou. As “frescuras” até que são românticas, mas ela descobriu que não passavam de dispensáveis. Mas teve o que ela sempre quis: carinho. Muito carinho. “E isso é primordial. Era a única coisa que eu não abria mão” – completou. E sorriu mais uma vez para as lembranças.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Verde-ansioso


         Ela decidiu: iria. Pegou o dinheiro escondido na gaveta de roupas íntimas. Saiu. Os passos iam seguindo os paralelepípedos da rua. Sua mente estava a mil e seu rosto ficava rubro cada vez que se lembrava do que estava prestes a fazer. Seu coração gritava descompassado.
         Dobrou a esquina. Viu o seu destino. A ansiedade tomou-a. Pensava no que as pessoas pensariam ao vê-la fazendo aquilo. “Ah, isso é puro preconceito!” – confrontou o pensamento ansioso. Entrou na padaria. Não havia ninguém lá fora os funcionários, só um senhor que surgiu na boca do caixa quando ela se aproximou do mesmo.
         O coração acelerou. Era um pensamento ultrapassado. Ela sabia disso. Mas a ansiedade não dá ouvidos a nada nem a ninguém. Aproximou-se mais do caixa e pegou uma camisinha. Entregou a nota à vendedora. Esperou o troco.  Guardou o pacote desesperadamente sem jeito dentro da bolsa. Para aumentar seu nervosismo, a mulher ainda quis lhe dar um troco maior, o que fez com que a operação se tornasse mais demorada. Saiu apressada tão logo pôde.
         Caminhava pela rua, rindo rubra do que acabara de fazer. Começou a imaginar o próximo encontro com o namorado. Sorriu ininterruptamente ao visualizar-se desengonçada e tímida, mostrando o pacote esverdeado a ele. Mas às vezes precisava voltar ao mundo real na hora de atravessar uma rua. O encontro ainda não tinha acontecido.
         Ela então escondeu a camisinha num bolso “secreto” da bolsa que sempre usava quando ia encontrar o seu amor e ficou no aguardo por notícias e convites dele para se encontrarem.

domingo, 6 de novembro de 2011

Floresta da Alma (Parte 1)


         A jovem andava pela praça principal de um pequeno vilarejo sob um capuz. Costurava as pessoas, imperceptível. Aproximou-se de uma banca de frutas e ofereceu algumas míseras moedas, indicando as maçãs rubras. “Só pode levar uma. E dê-se por satisfeita!” – disse o vendedor, ríspido. Ela pegou a maçã que este lhe oferecia, agradeceu e se foi. Comeu-a, satisfeita, como se fora um néctar dos deuses. Aquela certamente seria a sua única refeição do dia e poderia ser a única de muitos dias seguidos.
         Ela morava num mísero casebre na floresta e sobrevivia das peças que fazia em argila. Cada peça demorava dias para ficar pronta e nem sempre eram vendidas de imediato. Por isso, as moedas demoravam a aparecer. Além do fato de que nem sempre ela conseguia trabalhar de estômago vazio.
         Naquela noite, plena, a jovem ficou até tarde trabalhando. Foi dormir apenas quando não conseguia mais manter os olhos abertos. Exausta, esqueceu de apagar a vela. Acordou sufocada com a fumaça que tomava todo o casebre. Saiu correndo e assistiu impotente a vida, que até então conhecia, transformar-se em pó.
         Ela não tinha para onde ir. Não tinha parentes. Nem amigos. Estava só na floresta.
         Amanheceu.
         A jovem adentrou a mata sem consciência de seu destino. Talvez se perder de si mesma. Ou não. Caminhou até cair de sede. Avistou de longe uma matilha refrescando-se num rio, ao qual se dirigiu afoita. Bebeu daquela água, sem cogitar a possibilidade de um ataque dos lobos. Depois afastou-se.
         Sentia-se perdida. Havia deixado de ser o que era. E ainda não sabia em quê se transformara ou transformaria.
         Ao longo do dia, ela foi recolhendo galhos do chão. Precisaria deles para fazer uma fogueira à noite. Em sua busca, também teve a sorte de encontrar algumas frutas pelo caminho.
         O crepúsculo veio e, logo em seguida, a noite. A jovem fez a fogueira, mas não conseguiu dormir. Tinha muito medo que o fogo apagasse durante a madrugada ou que algum animal aparecesse.
         Pela manhã, a jovem comeu uma fruta e mais uma vez saiu em busca de gravetos. À noite, ficou em claro pastorando o fogo para que não se extinguisse antes da aurora.
         Alguns dias se passaram e a jovem ainda não dormiu. Permanece alerta para defender e alimentar aquilo em que ela está se transformando.

Seis de Novembro de 2011

sábado, 29 de outubro de 2011

Palavras (Não) Vãs


         Confiança. O fio rompeu-se. Onde exatamente não sei. Na infância, creio eu. É lá que vislumbro o início do comportamento egoísta e amedrontado. Passei a esconder minhas coisas de ti. Até as mais irrelevantes. O diálogo tornou-se praticamente nulo. E isso me dói muito. Sempre doeu.
         As palavras não são vãs. Eu queria mudar isso. Reverter esta situação de uma vez por todas. Sei lá como. Só sei que não aguento mais este tormento.
         Você é a pessoa que eu mais deveria confiar neste mundo. O dever, entretanto, nem sempre consegue ser cumprido. Como neste caso. Eu tenho muito medo de ser criticada, cobrada. Pior: eu tenho medo que me prenda de novo naquela redoma imaginária mais asfixiante do que qualquer calabouço.
         Por quê? Por que eu tenho esse medo dilacerante? As lágrimas vêm doídas e salgadas nesse instante. E sempre que penso nisso. Mas não consigo transpor esta barreira. Um medo de origem desconhecida me impede de tê-la como companheira e cúmplice.
         Eu não quero deixar esta vida sem tê-la como minha confidente. E eu ainda tenho esperança de que um dia sejamos as amigas que sempre sonhei que fôssemos. Mesmo este bloqueio sendo maior e mais forte do que eu ainda hoje quando escrevo estas linhas.
         Tenho muitas coisas para te contar, coisas que já aconteceram e as que ainda vão acontecer; todos os textos que escrevi e aqueles que o Universo ainda me reserva quero te mostrar.

Vinte e Nove de Outubro de 2011

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Da Morte e da Vida


A morte é um rito de passagem. É a renovação da vida. Se algo está morrendo, é para dar 
Espaço ao novo. Não se assuste nem lamente. A morte é tão natural quanto a vida.
Ela é um processo corriqueiro da existência. Celebre a morte do velho.
Ele lhe foi muito importante em algum momento da sua vida.
Mas ele lhe ensinou tudo que devia e agora precisa partir.
Deixe-o ir.
Amamente e embale o novo.
Permita que ele cresça forte e saudável.
Assim ele poderá lhe passar os ensinamentos que traz.
A morte é necessária para limpar os campos para a nova semeadura.
Mantenha-se em paz. A morte não extinguirá a vida que brota na nascente.
Tenha fé e deixe a morte fazer seu trabalho. O rio fluirá melhor depois de limpo.

Vinte de Outubro de 2011

sábado, 22 de outubro de 2011

A Menininha e o Fantasma

Esta é uma historieta bem simples, como as que contamos para as crianças. Mas esta história não é só as palavras externas. Permita-se mergulhar nas entrelinhas para ver o fundo do lago. Espero que gostem. Beijos!


         Era uma vez uma menininha. Toda noite quando ela desligava o abajur para dormir um fantasma vinha perturbá-la. A menininha, sentindo-se impotente, chorava até dormir por não ter coragem de enfrentar o fantasma. Durante o dia, acordada, a menininha pedia forças para confrontá-lo.
         Assim ela cresceu: à noite deixava-se abater pela presença do fantasma e de dia pedia forças para resistir às suas palavras.
         Uma noite, o fantasma veio visitá-la como de costume. Desta vez, entretanto, a menininha sentiu-se tomada por uma grande força e pediu:
         - Segura minha mão?
         - Eu nem soltei, menina – disse a Força.
         A menininha então voltou-se para o fantasma:
         - Vá embora!
         - Por que eu iria? Você continua sendo boba e ingênua.
         - Não! Eu cresci. Vá embora! Não preciso de você.
         A segurança da menininha transformou-se em luz e não se viu mais o fantasma.
         - Obrigada! – Ela abraçou a Força.
         - Estarei sempre aqui. É só me chamar.
         A menininha sorriu e nunca mais deu ouvidos ao fantasma.


Vinte de Outubro de 2011

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Dedicado ao Feminino

Dedicado à todas as mulheres neste Outubro Rosa. E os meninos sintam-se à vontade para prestigiar e compartilhar com as mulheres de suas vidas. Grande beijo!


         Eu saúdo o feminino dentro de mim!
         O corpo de carne é frágil, perecível. Isso não depende de mim. Ele morre um pouco a cada dia. Mas meu espírito é forte, sem prazos de extinção. E este eu posso trabalhar. E trabalho constantemente.
         Minha voz é doce e mansa, mas minha alma grita. Grita que preciso defender o que acredito ou desejo. Não há necessidade de elevar a voz. Segura de mim, sou firme e determinada, e um rosnado baixo já deixa bem claro minha posição.
         As minhas unhas não precisam ser garras enegrecidas e encurvadas. Eu sei me defender sem usar de força física. Minha mente está preparada para rebater críticas, xingamentos, cobranças arbitrárias e pensamentos pessimistas.
         Se sou grande, é para comportar o volume de ideias, experiências, sentimentos e projetos que vivencio e/ou tenho. Minha alma é imensa e precisa de um espaço considerável que se ajuste às suas necessidades.
         Sou mulher. E ser mulher é ser forte para mergulhar no abismo da fraqueza. E, ao chão, levantar-se e escalar a rocha para vencer a fragilidade. É brincar e dançar, mas saber gritar e rosnar diante do perigo. Ser mulher é ser dual, múltipla. É comportar vida numa caixinha de jóias chamada alma.

Dezoito de Outubro de 2011

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Ecos na Noite Escura


         No vazio da minha mente ecoa uma pergunta. Sempre a mesma a perturbar meu fraco juízo. Um uivo que ressoa por todo o vale e mais além. Mas a reposta nunca aparece na noite escura. Nem ao raiar do dia. "A luz que não é vista na escuridão certamente será ofuscada pelo sol" – ouço dentro de mim. Meus olhos, pesados, cerram um instante em concordância.
         Existe meio-termo? – eis a questão. Existe uma distância mensurável entre o oito e o oitenta? Alguns quilômetros... Talvez muitas léguas náuticas. Vários náufragos pelo caminho. Como eu. Ou quem sabe isso seja apenas ideias impregnadas que repetiram para nós em ladainha. Uma tentativa de controlar o espírito selvagem dos homens.
         A vontade é ingênua e impulsiva. Sua maneira não é a melhor. Os frutos não serão os almejados. Muito aquém disso. A regra (sociedade) impõe outro modo. Não me agrado. Na verdade, não me conformo. Custo (e não consigo) entender porque precisamos fazer o oposto do que queremos. Por que temos – desde que nascemos – o dever de perpetuar uma imagem contraditória? Não faz sentido.
         Tudo poderia ser tão mais fácil se eu pudesse seguir minha alma. O problema (sempre tem um) é que não consigo encontrá-la. Está tudo muito escuro lá dentro. E aqui fora também. Vejo os olhos das corujas me observando com seu ar de “velhas sábias” da floresta. Prontas para recriminar a mínina falta.
         A vontade e a regra brincam de cabo de guerra e eu sou a bolinha no centro. Quando a primeira vence, ponho tudo a perder com minha precipitação. O fruto é amargo. A lama cheira mal. Quando é a última, sinto-me infeliz, mesmo que o fruto seja doce e a grama macia.
         Nós lutamos por tanta coisa, mas não temos coragem de vasculhar o breu para libertar nossa alma. Não temos tempo para ouvi-la. O que ela quer? É o mesmo que a mente e o mundo exterior? “Ela quer a felicidade construída, como sapatinhos costurados à mão” – alguém sussurra na noite. “Ela não quer promessas “certas”. Nem abismos (talvez) sem fim” – o vento uiva.
         Tento, mas algumas coisas simplesmente não descem goela abaixo. Por que não podemos romper com o padrão? Simplesmente me irrita essa mania de complicar tudo. Queria seguir a ordem natural das coisas. Mas sempre temos que colocar empecilhos no caminho. Espalhar tachinhas pelo chão para ferirmos o espírito mais adiante.
         Não sei se um dia vou me render. Espero que não. Quero encontrar esse meio-termo. O refúgio da alma.

Doze de Outubro de 2011

domingo, 9 de outubro de 2011

Úmido

Um textinho que escrevi em parceria com meu estimado Sandoval Fagundes, o primeiro de muitos (eu espero)! E que dedico especialmente ao meu amigo e irmão mais velho, Anderson Meireles. Que gotinhas úmidas deste texto possam respingar não no teu coração, mas na tua alma. Espero que vocês gostem. Kissus!




         As ideias estão aqui dentro. Posso senti-las borbulhar. É lindo. Não sei como exprimir. Sinto seu colorido e sua energia, mas ainda não consigo vislumbrá-las, pois estão na parte mais funda do lago.
         As ideias estão na superfície do colorido da tua energia. Elas borbulham para dentro de tua imaginação como um lago reflete e traz o céu para dentro de si!
         É uma sensação muito boa. Sinto-me viva. O terreno, antes árido, está úmido. Úmido como não tenho lembrança de já tê-lo visto estar um dia. E se o lago reflete a umidade, se o colorido já tem sua energia e a vida é mais que um efeito, toda lembrança será um mar dentro do sertão.
         Posso sentir a alma vicejar. Ela baila ao som tranquilo do lago. E canta com o vigor de uma queda d'água. Ela tem muito a dizer. Mas não precisa usar palavras para isso. A vida que brota e transborda de seus poros diz todas as coisas mal exprimidas pela fala.
         É incrível como uma coisa tão imensa possa ser tão sutil. É vaporoso, é úmido, escorre por entre os dedos e impregna na pele da alma. É brilhante e lança faíscas através do olhar. E são essas pequenas centelhas que grudam no papel e se convertem em palavras para que o cérebro possa tentar compreendê-las.


Nove de Outubro de 2011

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Etéreo



         Deitada sobre seu tórax, sinto o ar inflar-te. Ouço tua voz de perto. As almas trocam experiências a menos de meio metro. Não sei bem o que elas cochicham em paralelo. Seus gritos são tão mudos que chegam a ser ensurdecedores. Você consegue ouvir? Tudo fala em derredor. Até o silêncio! Este é o que mais fala. Até o gás carbônico que nossos corpos rejeitam.

         Eu não me sinto num resto de nuvem. Eu sou a nuvem. Uma nuvem pesada sobre um conjunto de ossos. A chuva virá. Uma chuva abstrata ao invés de líquida. Mas que umedece minha alma.
         Surrealismo não vejo aqui. Mas vislumbro algo que não consigo racionalizar. Que dirá transformar em prosa poética. São sacos e mais sacos de sentimentos e sensações que passam por minha percepção e me causam algum torpor e euforia ao mesmo tempo. E passam tão rápido que não consigo identificá-los nem nomeá-los.
         Também ando distraída. E essas coisas estranhas não vão embora. Elas ficam em mim. E, mesmo com tempo, não consigo encontrar uma definição para elas. Quando eu as experimento (na hora e nas lembranças), parece que tomo algum líquido por demais homogêneo, do qual não consigo distinguir nenhuma substância.
         Isso é intrigante. Não é ruim. Só intrigante. Queria poder racionalizar para você ter uma vaga noção do que se passa em mim. Mas nem eu tenho essa ideia pouco nítida. São coisas que acontecem - e eu sei que acontecem - porém às vezes nem eu mesma vejo acontecer. Apenas fico com o registro inconsciente do sentimento que passou.
         Não adianta. Estou perdendo meu tempo. Não vou conseguir traduzir em palavras o que nem o sentimento distingue. Mas você entendeu que sinto algo muito bom quando estou contigo, não é mesmo? Isso já valeu todo o esforço de tentar racionalizar o etéreo.

Quatro de Outubro de 2011

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Maturação


          Eu acreditei que o amor era aquelas minhas utopias que beiravam o absurdo. Deveria ter acreditado menos. Mas era inocente em demasia. Muito floreio eu fazia. Uma poesia de cores que a natureza nunca pensou em criar. Agora parece que o véu da ilusão está sendo levado pelo vento. Vá. Não vou correr atrás.
         O amor está se mostrando mais próximo do possível. Ele não tem mais o céu cor-de-rosa ou a grama azul. Ele tem cor de pele e cheira a suor. Não é onírico, é real. Natural.
         A graça dos diálogos é discordar. Não o tempo todo. É dizer o que pensa e sente. Sempre. Mas sinceridade – não é grosseria. Uma voz doce, porém segura dos absurdos que defende, é mais convincente. De que outro modo poderia fazê-lo acreditar nos meus projetos mirabolantes?
         Eu não preciso agradá-lo o tempo todo. Nem devo. Meus desejos estão expostos sobre a mesa. Não coloque seus pezinhos nem derrame café sobre eles. Respeite-os. Como respeito os seus espalhados pela casa.
         Nenhum pássaro pode voar com uma asa só. Diga quando eu me comportar mal, mas saiba reconhecer quando eu lhe fizer um agrado. Ninguém gosta de ser apontado só pelos erros. Mas também não mime demais. Você ouviu bem as letras que seus olhos acabaram de ler. Quem só recebe elogios acha que não tem mais o que conquistar na relação.
         Eu tenho todo o tempo do mundo pra você. Não. Minha vida já estava pronta quando chegou. Vou encaixá-lo. Minto. Você terá que se encaixar nela. Minhas horas não serão todas suas. Talvez meus pensamentos. Mas, enquanto isso, estarei ocupada com a vida própria que tenho além da nossa relação. Afinal, se não fizermos nada sozinhos, como teremos alguma novidade para contar? E isso não tem nada a ver com infidelidade. Isso é respeitar a liberdade do outro em viver uma vida que ele já tinha antes de te conhecer. Infidelidade, ao contrário, é falta de respeito.
         Se eu te amo, não vou exigir que me provenha tudo. Quero dividir. Não estou falando de dinheiro. Estou falando de tudo: carinho, atenção, sexo, amizade. Quero ter também. Quero me sentir plena com você do meu lado e quando estiver na casa dos seus amigos namorando a televisão. Afinal, minha vida não para se você não estiver aqui segurando minha mão. Nunca parará.  Mesmo que você decida ir embora um dia.

Vinte e Sete de Setembro de 2011

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Carta de Amor e Cura


         Você me perguntou o que eu queria de você depois de eu ter lhe feito a mesma pergunta. Na hora eu respondi qualquer coisa. Mas a resposta profunda ficou guardada. Creio que agora ela chegou. E é por isso que escrevo estas linhas.
         Não quero que seja o que eu sempre esperei dos outros que cruzaram meu caminho: um analgésico. Aquela outra metade que todos procuram, sabe? Não. Essa outra metade está dentro de mim. Sempre esteve, embora nunca a tenha usado. Somos seres duais e, para sermos inteiros, precisamos usar nossas metades. Você se sente inteiro? Eu o quero assim. Não desejo ser sua metade e nem que seja a minha.
         O amor são duas peças de um quebra-cabeça que encaixam uma na outra. Se você pegar uma delas e cortar ao meio, o encaixe ocorrerá? Não. É preciso que as duas estejam inteiras.
         Corações feridos não se entregam totalmente. Até que reconhecem o ferimento e o tratam. O problema é que alguns desses corações esperam que o outro os tratem. Mas cada pessoa tem que curar seu próprio coração.
         Os espinhos são muitos dentro de mim. Eles são as aspirações utópicas, os medos. São coisas minhas. Feridas cuja cura está sob minha responsabilidade. Mas você é muito importante nesse processo. Você vai enxugar minha testa suada de exaustão. Todavia, não entenda essa frase em seu sentido literal.
         Quero que seja a renovação ao final de cada rodada, a revitalização depois de muitas horas tentando tirar os espinhos. Não conseguirei tirá-los todos de uma só vez. Cada espinho retirado deixará um buraquinho e este será preenchido com amor, o meu e o seu. O meu para preenchê-lo de fato e o seu para protegê-lo de novos espinhos enquanto cicatriza.
         Não estou pedindo que me cure. Só que faça o curativo depois que eu retirar o espinho.  E que me abrace bem forte e afague meus cabelos quando o amor transbordar do meu coração regenerado.

Dezoito de Setembro de 2011

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Flamboyants e Sopa de Estrelinhas

Oi, gente. Essa é uma homenagem singelíssima ao grande Rubem Alves. Hoje, 15/09, ele está completando 78 anos. Espero que gostem. Kissus!



Flamboyants e Sopa de Estrelinhas



         Não sei bem o que escrever. Como fazer uma poesia para quem não se sente poeta (e o é com maestria), bem diferente de mim? Flamboyants, ajudem-me. Tenho aqui lápis e papel. O que me podem dizer sobre este filósofo?
         Os escritores deveriam ser sérios, assim como os psiquiatras. Mas talvez eu não seja escritora. Amo as letras simplesmente e gosto de brincar com elas, assim como o Rubem Alves com seus peões giratórios e sua sopa de estrelinhas.
         É verdade: tenho um fascínio por escritores mineiros. Não sei bem o porquê. Talvez seja por seu linguajar simples ou a alma infante que carregam e espalham. O Rubem Alves tem olhos poéticos diante da vida e isso transborda em suas letras e escorre pelo papel, caindo bem no centro de nossos olhos.
         Todavia, o que é a vida? O grande filósofo-poeta-psicanalista disse: “Confesso que, na minha experiência de ser humano, nunca me encontrei com a vida sob a forma de batidas de coração ou ondas cerebrais. A vida humana não se define biologicamente. Permanecemos humanos enquanto existe em nós a esperança da beleza e da alegria.” Mas e esta alegria? Ela é oriunda de onde? Acredito piamente que nossa criança interior é a guardiã soberana de nossas reservas de contentamento. Que tal tirar fotos dos flamboyants numa manhã de sol, ou ainda brincar de peão ou tomar sopa de estrelinhas? Parece bobo um adulto fazendo essas coisas, mas existe coisa melhor que ignorar a rigidez da maturidade e rir de si ou consigo mesmo? Isso é ser criança e não precisa renegar seus cabelos brancos para manter sua chama viva.
         As crianças são sábias e quem conserva sua alma infante, conserva também o encanto pela vida, o prazer de viver. Não existe nada que me deixe mais deslumbrada com a vida do que contemplar uma nimbus (aquelas nuvens fofinhas que mais parecem pedaços de algodão) ou ver o chão repleto de flores de alguma cerejeira, de algum ipê roxo ou mesmo de um jambeiro, ou quem sabe observar os galhos retorcidos de um flamboyant.
         Certa feita, Rubem Alves lançou a proposta de que vivêssemos como se tivéssemos só mais um ano de vida. Embora algumas pessoas tenham achado mórbido, reconheçamos que muitas vezes precisamos de um prazo determinado para vivenciar algo em sua plenitude. Assim como só entregamos um trabalho mediante um prazo. “Quem acha que vai viver muito tempo fica deixando tudo para depois.”
         Entretanto...
         “As flores dos flamboyants, dentro de poucos dias, terão caído. Assim é a vida. É preciso viver enquanto a chama do amor está queimando [...] As palavras que devem ser ditas, devem ser ditas agora. Os atos que devem ser feitos, devem ser feitos agora.

Nove de Setembro de 2011

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Gole de Lucidez


         A loucura tomou um gole de lucidez e embriagou-se de apatia. A realidade converteu-se em água fria e lançou-se sobre minha euforia. Não tiro sua razão. A minha que estava em desuso. Na verdade, achei-a por acaso dentro de uma conversa informal.
         Quando o amor veio foi com pressa e intensidade. Encontrou meu coração na vontade e cativou-me. Mais que isso. A loucura amordaçou a ingenuidade. Incitou a fome de liberdade. O medo foi quem puxou o freio de mão, apressado. Um coração descompassado. Alívio ao dobrar a esquina antes de um beco sem saída.
         A vida pôs o dedo no meu olho: “Não pode ser assim”. Não pode. Tudo bem. Não vou colocar o dedo na tomada. Eu não nadei até aqui para morrer afogada. A ilha está logo adiante. Que custa nadar mais um pouco?
         A sede é grande. O mar é abundante. Mas o sal é intragável. O desejo de mergulhar é mútuo. Sim, nós vamos. Marque na sua agenda. Só não estabeleça datas rígidas. Quero explorar a ilha junto com você. Antes, todavia, garanta-nos água potável e protetor solar. A aventura reserva seus encantos, mas também esconde suas obscuridades. O dia é claro. A noite, sorrateira, deixa ver apenas o reflexo do luar.
         Respire. Vamos desacelerar as braçadas. A exaustão pode deixar-nos à deriva. Nademos contra a maré. Sobrevivamos à afobação. Deixe que a pressa afunde sozinha. A plenitude resgatar-nos-á no final do horizonte.

Nove de Setembro de 2011

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

O Desabrochar da Flor

A
Flor
Desabrocha
Enquanto o sol
Esquenta suas pétalas.
O orvalho escorre por seu corpo de veludo.
As pétalas cedem e o miolo aparece
Para o doce deleite do colibri.
A flor beija, beijoqueira,
O colibri, matreiro.
O desejo de que, nesse
Beija
Beija,
Acon-
Teça,
Enter-
Neça,
O
Ins-
Tante
De
Amor.

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Aflorada


         Quero o cheiro. O cheiro que não suguei, não gravei. Um cheiro que sei (inconscientemente) ser bom. Afinal, tenho saudade do que é bom.
         Os sentidos estavam aguçados. Todos. Ao mesmo tempo. Algumas sensações não chegaram inteiras. Quero puxá-las de novo, escancará-las. O que não está fixo, atar com um laço bem forte. Guardar na memória imperecível.
         Eu quero teu beijo. Quero a sede. Pois é ela que move todas as águas. Teu lábio puxando meu; massageando o desejo, a loucura. As línguas enroscando-se num frenesi fora de órbita. Ou era eu que estava em algum universo paralelo? Não importa a equação. O resultado já nos tomou.
         Quero sentir teu pulmão gritar. O ar que entra parece insuficiente. O que sai é demasiado. A respiração é quente. O vulcão me faz estremecer ao aproximar-se do meu ouvido. O vento frio dos altos píncaros cruza a fronteira entre o externo e o interno. O arrepio desnuda-me.
         Quero sentir teus dez braços enlaçando-me. Sentir nitidamente suas mãos percorrendo meus relevos, queimando ao cair em reentrâncias. Quero ouvir minha pele estremecer mudamente, sibilar.
         Quero o dengo. Aquela carência preenchida do teu abraço. O desencaixe perfeito de tuas mãos na minha. E o jeito que beija meu pescoço enquanto falo só para me desconcentrar. Onde parei mesmo? Não importa. Quero começar agora.

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Sentidos Despidos


Uma empatia grande tomou-nos.
Sentimo-nos à vontade,
Confortáveis um com o outro.
Suas mãos, desenvoltas,
Desenharam minhas reentrâncias.
Seus beijos, múltiplos e envolventes,
Sua respiração quente
Rente ao meu ouvido,
Aguçaram meus sentidos,
Arrepiando-me.
Um abraço aconchegante,
Um dengo gostoso,
Um prazer despido
Sem precisar despir.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Onírico


O desejo de ser tocado
Com a suavidade do sonho
A leveza da brisa
O fulgor da realidade.

Mãos, olhares, sorrisos, suspiros
Tudo toca.
O mundo se toca.
E o mundo somos eu e você.

Não no mundo.
Mas aqui dentro de nós.
Neste espaço só existe espaço para nós
E tudo mais que trazemos conosco.

Desejo, paixão, euforia, júbilo
Tudo vem impregnado na pele e na alma.
Eles falam por e muito melhor que nós,
Com mais nitidez e veracidade.



créditos da imagem: Ramon  de Assis

sábado, 27 de agosto de 2011

Cristal de Vidro

         Sim e não. Sim ou não. Não existe espaço para um talvez. Talvez é a resposta automática de quem não sabe o que quer. Quando alguém faz-nos uma pergunta, a resposta já vem, seja do coração ou do cérebro. Porém, não raro, hesitamos em aceitar aquela resposta e pronunciamos o talvez. 
         O homem (a humanidade) é bicho complicado, condicionado, quase sempre, à opinião alheia. A emoção e o corpo dizem sim, mas a razão – no momento mais crucial – lembra-se da opinião – que talvez – sua mãe, seu vizinho, sua tia-avó, seu papagaio venham a ter e recusa-se a ir. E quem comanda o corpo é o cérebro, portanto, se ele disser: “Não, eu não vou!”, nem o seu mindinho do pé sai do lugar. Mas o cérebro, apesar de agir como um deus maior do nosso universo particular, não é onisciente, isto é, ele não sabe – sempre – o que é melhor para nós. Sendo bem sincera, às vezes ele é muito medroso: “Não, eu não quero macular a minha reputação”. Grande reputação! Se você se acostumou a dizer não quando na verdade queria dizer sim só para não matar sua tia-avó (já com cem anos e cuja voz já está sumindo e a audição nem se fala!) de desgosto, então sua reputação é mais falsa do que um cristal de vidro.
         O ser humano é falso, uns mais, outros menos, mas todos são. E pior: são falsos consigo mesmos, visto que o outro – na hora pelo menos – não tem como comprovar a falta de veracidade de suas afirmações.
         Sim e não. Não podemos viver só de sim, senão somos bestas, passivos, subservientes demais. Também não podemos usar só o não, caso contrário seremos os chatos, antipáticos, caretas. Saibamos, então, equilibrar os dois e quando utilizar cada um deles. Procuremos (eu estou mais que inclusa nisso) sermos sinceros conosco antes de sermos com terceiros. Sempre vai ter quem fale mal de nós, mesmo que seus argumentos sejam uma máscara de papel machê que usa para acobertar sua inveja. Saibamos, outrossim, reconhecer quando a razão estiver com a razão.
         Porquanto, de quê adianta agradar aos outros se não abastecemos regularmente nossa reserva interna de amor-próprio? É fato irrefutável que nunca seremos felizes se apenas fizermos o que é aprazível para as pessoas que nos são caras (e dentre estas não está quem deveria ser a primeira da fila: nós). Afinal, a felicidade consiste em amar a nós mesmos, e, quem ama, procura o bem-estar do objeto de sua afeição. Com isto não estou querendo dizer para colocar-nos num pedestal, ou sermos narcisistas. Simplesmente quero dizer que o elogio, a aceitação e a felicidade precisam nascer de dentro para então irradiar para fora, só assim não ficaremos condicionados aos “achismos” de outrem.

domingo, 21 de agosto de 2011

Parto


         Literatura é entrega, doação. É abrir-se para receber. É fascínio, amor.  Quando amamos o ofício, a abertura acontece e as ideias vêm.
         Ninguém domina as palavras. Eu tampouco. É ilusão querer que venham as palavras certas e frases impecáveis. Não vem. Logo quando sai de nossa alma, não. São como um feto que acabou de sair do ventre da mãe para ganhar o mundo: vêm sujas de sangue e sebo. Precisamos abrir-nos e aceitar as ideias como vêm. Assim como a mãe ama e aceita aquela criaturinha suja e pura no primeiro instante em que a vê, e mesmo antes disso. Mas com os textos temos a oportunidade e o poder de edição. Precisa só ter jeito. Ei-lo:
         Não importa que as palavras venham maltrapilhas, sujas, feias, escuras; eu as aceito: “Oi, tudo bem? Sente-se! Fico feliz que tenha vindo!” Então conversamos, trocamos confidências, e os sentimentos são verbalizados por elas. Adentramos o espaço uma da outra sutilmente, permitimo-nos este acesso. Durante este processo, nós nos aceitamos e compreendemos. Ao final, mais leves e abertas, permitimo-nos ser moldadas. Enquanto moldo (edito) as palavras, moldo a mim mesma, ou melhor, elas me moldam. Então frutificamos.
         Posso dizer que cada texto é um caso de amor. Primeiro nós nos esbarramos, depois trocamos impressões, então ajustamo-nos, entramos num consenso e encaixamos. Amamo-nos por fim, e damos à luz o texto, fruto maior da paixão pelas letras.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Sinuosidade


Sensível. Eu sinto, percebo-te.
Flexível. Abro-me. Permito-me.
Compreensível. Aceito-o.

Maleável. Estou aberta a novas ideias.
Dobrável. Admito-as e sou capaz de adotar.
Amigável. Desarmo-me quanto ao outro.

Sinuoso.  Reconheço a não-retidão da vida.
Diverso. Assumo que há mais de uma ideia correta.
Oposto. O diferente não é sempre ruim.
Certo. A certeza tem muitas facetas.

Opção. Escolho entre novos e velhos conceitos.
Dualidade. As partes formam o todo.
Emoção e Razão. A alma plena.
Serenidade. Ideias que se aplicam a cada situação.

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Um Velho Apaixonado

Esta é uma pequena homenagem minha a um de meus ídolos e um dos maiores poetas brasileiros já nascidos: Carlos Drummond de Andrade. Hoje (17/08/11) faz vinte e quatro anos que ele faleceu e eu não podia deixar essa data passar em branco. Espero que gostem. Kissus =)



       "O amor bate na porta." Quem será? Corro à sala de estar e, ao abrir a porta, eu me deparo com ele: Carlos Drummond de Andrade. Peço que entre e se acomode. Há quanto tempo não o via!
       Levo-o à cozinha modesta de minha casa. Sirvo-lhe um café preto e para mim um refresco de laranja.

domingo, 14 de agosto de 2011

Colibri ou Flor


O colibri ou a flor?
Quem sou?
Agir ou esperar?
Beijar ou deixar-se beijar?

Agora sou um
Doravante posso ser outro.
O beijo pode ser desejado por ora
Depois posso querer roubá-lo.

O colibri ou a flor?
Depende do olhar
Depende do orvalho
Ou quiçá da sede.

Hoje tenho sobrando
Amanhã posso carecer.
Hoje estou forte
Amanhã posso me render.

Colibri ou flor?
Sou os dois.
A junção de ambos.
A diversidade no agir.