sexta-feira, 26 de julho de 2019

(Des)encontros nas livrarias da vida


Confesso que, apesar de ser leitora voraz e prosadora crônica, eu nunca fui uma frequentadora assídua de livrarias; embora o meu tio-avô fosse o dono de uma das livrarias mais conhecidas da Paraíba: a Livraria do Luiz. De tal sorte que nunca tive vivências extraordinárias nas livrarias que cheguei a frequentar. Mas a vida gosta de nos surpreender.

Semana passada, na livraria de um importante shopping da capital paraibana, encontrei um amigo do Facebook. A bem da verdade, foi um (des)encontro. Não havíamos combinado nada e nem eu sonhava em encontrar qualquer rosto conhecido lá. Sendo bem sincera, eu tenho a (in)felicidade de andar por esta ilustre província sem encontrar nenhum rosto conhecido. Então, quando o vi na livraria, eu fiquei sem ação. E, enquanto o atendente buscava o meu pedido no sistema, arregalei os meus olhinhos de cometa para o homem ao meu lado no balcão: “É o Carlos Adriano?!”. E, em minha mente, ensaiei inúmeras vezes uma abordagem: “Oi! Você é o Carlos Adriano?”. De repente, o homem me olha com olhos tão arregalados quanto os meus. Nesse instante, fiquei ainda mais temerosa de perguntar se ele era o Carlos Adriano e a situação tornar-se ainda mais esquisita e constrangedora.

Cerca de cinco minutos depois, o rapaz trouxe a minha encomenda e eu fui para casa, ainda com a pergunta não verbalizada: “Será que era o Carlos Adriano mesmo?”. Definitivamente, eu precisava descobrir se tinha sido ele mesmo que eu vira. Por isso, mandei-lhe uma mensagem no Facebook, perguntando se fora ele que eu vi àquela tarde na livraria, mas, em princípio, não obtive resposta. No dia seguinte, insisti. Mais que isso: disse que, se de fato era ele, me perdoasse por tê-lo olhado com olhos tão arregalados. Contudo, só obtive uma resposta sua no dia subsequente: “Ah, era você também?”. Rimos juntos da situação: dois assustados numa livraria. Então, ele me disse que também desconfiara que eu era eu, mas que também não tinha tido coragem de perguntar.

“Viver dói”, disse Clarice Lispector. Sabemos todas as convenções sociais, mas, na hora de aplicá-las, reagimos como crianças estupefatas: nossos olhos se arregalam e a voz nos falta. E ficamos tão abismados com o que experienciamos, que perdemos a oportunidade de conversar sobre arte e literatura, enquanto tomaríamos um café. Tudo bem. Fica para a próxima.

Não obstante, desejo que, no próximo encontro orquestrado pelo Destino nas livrarias da vida, eu não me assuste tanto e seja mais fácil uma aproximação.

domingo, 14 de julho de 2019

Asas de chumbo

Desenho by: Sofia Cesar
Minhas asas pesam. Minhas asas me pesam. Pesam, sobretudo, porque não sei voar com elas. Asas inúteis! De que me servem? Eu quero destroçá-las! Quero esquecer que tenho asas e não posso voar. Eu as pinto, para que fiquem lindas. Lindas e inúteis. Beleza nunca aqueceu asa para o voo.

Minhas asas... pesam. São um fardo que carrego, sem poder usá-las para o que foram feitas. Se a natureza delas é serem asas, o que as impede de voar? A elas, nada. A mim, o medo de ser voo.

Minhas asas me aborrecem. Aborrecem, porque preciso cuidar para que permaneçam lindas, mesmo sem usufruir delas. De que me adianta ter asas e não ser livre? De que me serve ter asas e viver dentro de um círculo de giz riscado no chão?

Minhas asas me aborrecem. Aborrecem mais ainda, porque renascem sempre que as desfacelo. Aborreço-me sobremaneira, porque não consigo exterminá-las em definitivo. Aborrece-me ao infinito não crer que posso voar com elas.

Minhas asas são insustentáveis. São asas de chumbo as minhas. Nelas, concentro todo o meu medo de ser luz.