quarta-feira, 25 de maio de 2016

O que seus olhos (não) viram

            A mulher selvagem acordou e seu amanhecer ofuscou-o. Cegou seus olhos, que viram o que você quis ver. O corpo existia. A demanda interna era minha. O que seus olhos viram, porém, só eles viram. Eu vi; eu senti o que senti. Mas o que você viu é seu, não meu.
            O desejo existiu. Entre o desejo e sua consumação, porém, há um abismo inenarrável. O desejo pode existir apenas por existir. Apenas para ser sentido. Sua concretude, no entanto, exige muitos outros fatores.
            A vazão da mulher selvagem não é tão simples, tão efêmera. A mulher selvagem é profunda, intensa, e a superfície a afoga. Afoga, porque o mar de dentro não se contenta em apenas molhar os pés.
            O desejo existe. O desejo de sentir as ondas lamber-me somente os pés, não. Eu quero mais. Quero uma fusão profunda. Quero algo sublime e inesquecível. Não quero este amor líquido, que escorre pelas carícias e deixa o coração encharcado depois.
            A mulher selvagem existe. Ela está aqui e está muito bem acordada. Tão acordada, que não vai aceitar o vazio que preenche.

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