Eu
era pequena, bem pequena, e muito ativa, muito traquina. Um dia, um moço, que
nem me lembro mais o rosto nem o tipo físico, um moço apenas, estava
consertando o sofá da casa da minha avó. Casa da minha avó é um modo de dizer,
porque era a minha casa naquela época. Não era uma propriedade minha, mas era
onde eu morava. Então era a minha casa. Voltando ao moço que estava consertando
o sofá, ele estava fazendo algum remendo na estrutura de madeira do sofá.
Enquanto isso, eu, com toda a minha alegria infantil, estava sobre o encosto do
sofá, dançando. Eu estava lá, completamente envolvida por aquele “ilariê”,
completamente imersa na minha própria alegria. Até que o meu passo foi maior do
que o espaço e eu caí. Antes de encontrar o chão, porém, minha testa foi ao
encontro do esqueleto do sofá. Quando finalmente beijei o chão, minha testa se
abriu ao meio. Viram apenas o sangue e me levaram para o hospital. A partir
daí, eu não estava mais consciente. Não me pergunte o que aconteceu no
hospital. Eu não poderei dizê-lo. E que bom que não me lembro! Mas me lembro da
alegria que senti, quando retornei à minha casa. E da alegria que eu sentia
cada vez que dizia a alguém: “Ganhei cinco pontos!”. Um verdadeiro espólio de
guerra. Ganhei cinco pontos! À medida que fui crescendo, a cicatriz, que antes
era exatamente no meio da testa, foi se deslocando e foi subindo. Hoje, ela
está acima à esquerda, quase rente à raiz do cabelo. Hoje, ela está quase
invisível. Namorados meus chegaram tão perto e mesmo assim não a viram. Ela é
só minha. É a minha cicatriz. É o meu espólio de guerra. É a lembrança mais
nítida que eu tenho de cair e levantar-se com alegria. Que eu possa me lembrar
desta queda e mais ainda de como soergui intacta e feliz.
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